23.4.08


(caneta sobre papel, março 2008)

20.4.08


(tinta-da-china sobre papel, 1990)

encontro-te por vezes nesse lugar ermo
de silêncios impuros e crepúsculos indolentes
que atravesso tão depressa quanto uma bátega de abril tão depressa
que o teu olhar quase não reconhece a intranquilidade que me assola
enquanto descem persianas correm estores e baixam pálpebras

do outro lado da rua ao entardecer.

13.4.08



da minha janela para a tua

há um veio de luz reflectido pelas águas inquietas do Tejo

entre parapeitos
um abismo onde as copas dos plátanos e dos choupos escondem
pracetas calcetadas florescem tílias azuis jacarandás
velhos sentados em bancos de madeira cruzam as mãos no regaço
olham devagar o cintilar da luz solar que atravessa as sombras
quando a brisa sopra riem como os rapazinhos que desenham círculos
enquanto os pneus das bicicletas chiam no alcatrão e adolescentes falam
tão alto para os telemóveis

da minha janela para a tua
há uma vaga de pólen que tudo embriaga mesmo quando chove
e às copas das árvores somam-se os guarda-chuvas abertos
vejo-os rodopiantes riscando percursos nesse sopro de luz
que são os cabelos húmidos das raparigas tagarelando no regresso a casa
ouvem-se os passos dos homens e das mulheres
percebe-se quando levam uma criança pelas mãos também cintilam
mesmo quando são escuros e distantes os olhares
e se embaciam as vidraças que resguardam
os rostos de quem apenas contempla
uma rapariguinha aprende a coser botões

da minha janela para a tua
a cidade repete-se intemporal
o ar traz o sal liberto pelas vagas que embateram na costa
da minha janela para a tua entre parapeitos entre mãos
vai o olhar de um rapaz intranquilo que faz soar a guitarra eléctrica
propagam-se os sons que abalam a caixa toráxica da cidade dormente
embatem no diafragma das sombras que celebram o anoitecer

e fico arfante
sou o torso pálido de uma gárgula debruçada sobre a rua onde passas
o teu desejo é um veio de luz reflectido pelas águas inquietas do rio.



© filipe paes, 2008

vazam-se olhares de cinzas
o peito que se arrebata do plano fantasmagórico de todas as ausências
vazam-se as mãos umas das outras aguardam-se tempestades
e enquanto se vazam desesperos
a pele seca
engelha-se

a ossatura dissolve-se
o olhar silencia-se

.

(lápis sobre papel, abril 2008)

12.4.08

dia 18 de abril, pelas 21h

apresentação por Nuno Júdice


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6.4.08

sigo por rio de couros a sombra acre dos muros cegos
sinto-a sobre a pele enquanto seguras as minhas mãos
sigo por rio de couros proibido
logo ali do outro lado da alameda
logo atrás da casa da professora da modista
dos vestidos de seda grossa das saias de mousselina
pacientemente cosidas no sobrado estreito
dois por piso ao longo de quatro patamares

(mas não é dela que quero falar)

é de rio de couros ali logo atrás da linha do casario
cosido à alameda que o ditador rasgou no burgo


(mas também não é desta que agora quero falar)

para trás o saibro vermelho as fontes o coreto
desço a rio de couros por ruas estreitas onde já ninguém passa
sigo a sombra acre dos muros cegos
neles estão ancorados os arcaboiços vazios do curtume
neles imagino naves barcas aeroplanos
enquanto os teus dedos tacteiam os meus pulsos
tomam os meus antebraços
tão devagar

cai
sobre a pele a luz entrecortada pela fasquia de madeira
entrecortada pelos teus dedos que quase tocam o rubor das minhas faces
ali onde não há rosas-da-china nem pomares
onde a seiva do sumagre não serviu para fazer laca-do-japão.

2.4.08

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