13.4.08



da minha janela para a tua

há um veio de luz reflectido pelas águas inquietas do Tejo

entre parapeitos
um abismo onde as copas dos plátanos e dos choupos escondem
pracetas calcetadas florescem tílias azuis jacarandás
velhos sentados em bancos de madeira cruzam as mãos no regaço
olham devagar o cintilar da luz solar que atravessa as sombras
quando a brisa sopra riem como os rapazinhos que desenham círculos
enquanto os pneus das bicicletas chiam no alcatrão e adolescentes falam
tão alto para os telemóveis

da minha janela para a tua
há uma vaga de pólen que tudo embriaga mesmo quando chove
e às copas das árvores somam-se os guarda-chuvas abertos
vejo-os rodopiantes riscando percursos nesse sopro de luz
que são os cabelos húmidos das raparigas tagarelando no regresso a casa
ouvem-se os passos dos homens e das mulheres
percebe-se quando levam uma criança pelas mãos também cintilam
mesmo quando são escuros e distantes os olhares
e se embaciam as vidraças que resguardam
os rostos de quem apenas contempla
uma rapariguinha aprende a coser botões

da minha janela para a tua
a cidade repete-se intemporal
o ar traz o sal liberto pelas vagas que embateram na costa
da minha janela para a tua entre parapeitos entre mãos
vai o olhar de um rapaz intranquilo que faz soar a guitarra eléctrica
propagam-se os sons que abalam a caixa toráxica da cidade dormente
embatem no diafragma das sombras que celebram o anoitecer

e fico arfante
sou o torso pálido de uma gárgula debruçada sobre a rua onde passas
o teu desejo é um veio de luz reflectido pelas águas inquietas do rio.



© filipe paes, 2008

14 comentários:

hora tardia disse...

in.comentável.


!!!
______________.


palavras de romper.


,


beijo.

Luis Eme disse...

o poema é lindo...

tenho uma janela quase assim...

Anónimo disse...

é bom chegar à tua janela e deparar com tanta beleza e talento.
beijos
marisa

P.S. que seja um dia fantástico, o 18

L. disse...

oi blue

Deixo aqui o link para o meu novo blog de poesia, “uma só vida?...”
Vou postar por lá a minha poesia toda, entre 1995 e 2008

Acrescentei lá o teu link, estou a tentar juntar o máximo de blogs de poesia em português

CNS disse...

Escreves luz, Blue.

Laura Ferreira disse...

das tuas palavars para todos, há um quê de (muito) encanto.

Night Shadow disse...

desta janela para outra, perdemos as palavras para longos silêncios.

CCF disse...

Vejo como no cinema :)
As tuas palavras trazem as imagens agarradas como ultimamente nenhumas outras.
~CC~

Bandida disse...

palavras azuis são aquelas que se estendem nas mãos até à pele do dia.

magnífico o teu poema!


beijo B.

Scarlata disse...

Que bom aqui voltar... Ola' Blue!

;D

isabel mendes ferreira disse...

mt obrigada Blue...pela indicação.


__________________.

casa de passe disse...

fico nas nuvens
quando um Cliente me agrada



LouLou

Heduardo Kiesse disse...

sublime!!

Cometa 2000 disse...

belíssimo, como habitual.

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