20.1.07


(aguarela e tinta-da-china, sobre papel, 1998)

desenho às vezes para reter imagens
sob a escuta que as minhas mãos traçam quando olho:
o teu corpo estendido sobre uma manta branca,
ou as tuas mãos apertando um cigarro levemente.
ou o cheiro dos lençóis quando repousas o rosto nos meus ombros.

às vezes, pergunto-me do que faço delas
e perco os olhos nestes movimentos de ida e volta ao que não sei
e então escrevo:
quero lembrar-me de ti, de mim,
do odor da madeira volteando entre suspiros, beijos ou conversas
e respiro fundo os sons de um qualquer disco arranhado,
sofregamente.

mas quando tento nomeá-las, a elas, às imagens,
fico de indicador pendurado
e já só as sei vagamente horizontais, como nalgumas canções.

nunca consigo terminá-las.

não possuem rigor as minhas vistas do que somos quando nos movemos
e a cidade volteia ao nosso lado;
nem sequer quando nos abrigamos numa varanda fresca
à luz do verão para desenhar palmeiras.
e quando tento ser rigorosa,
só sou fria, destemperadamente fria,
como se o corpo já não o fosse
e os riscos se partissem inexpressivamente sobre o papel.

é então que me deixas só, ou melhor,
quando abandonas a minha solidão na direcção da tua.

3 comentários:

blue disse...

o texto foi escrito em 1985.

Anónimo disse...

muito bonito, o poema.
lindas, as aguarelas.
armanda

Anónimo disse...

e em muito boa hora foi escrito e posto aqui para pode ser lido!
sandra

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