31.10.09


© agrafo.

que bom tê-lo de volta aqui
.

20.10.09


chego tarde evito a quarentena dos aflitos

arrumo o quarto a secretária os elos os sobressaltos a crónica da anemia

aliso a cervical de esguelha observo quem se aproxima

no mouth no neck no rest

observo raparigas que lêem

hoje uma caiu nos braços de um rapaz tranquilo amparámo-la até chegar o INEM

a gabardine do revisor protegeu-a quando chovia

ao atravessar o cais para a praça de táxis

revejo a imagem de um outro rapaz que lia Virginia Woolf apoiado

no estofo azul dos bancos da locomotiva

tem agora os pés salgados pela água do estuário

levado por um rio de prata por peixes estranhos

por tantas melodias e eu

desenho estruturas metálicas pontes passadiços plataformas

desenho raparigas que lêem nos transportes públicos desmaio

ultrapasso os condicionalismos da minha mobilidade

não tenho carta nem rota

a linha imaginária entre dois estratos em silêncio.

13.10.09

pilhas de livros no chão da livraria na mesa no balcão
uma cave onde se alojam volumes e segredos

longe da montra sobre a rua face a face

uma casa de brinquedo um conto de reis

uma resma de livros nos dedos manchados de tinta.

já passa das dezanove encerras o escritório

antes de subir contaras

geométricos azuis-bébé verdes-retrete azulejos
polidos
o aleatório visual transformado em pauta no córtex do dia

contaras depois as horas os estalidos do isqueiro os requerimentos as alocuções

as mudanças de tonalidade no céu colhido pela janela basculante

observaras os rolos de fumo acumulados na massa de ar do compartimento

atribuíras-lhes palavras um jogo mas

adormecida fica a máquina de escrever agora que se foram o sócio e a secretária

os lances de degraus atravessam-se no sentido contrário e


num sopro de laca o Outono varre a cidade
da penumbra dos cedros do Líbano às folhas de carvalho
que crianças perseguem no saibro vermelho.


6.10.09

sentimental tão sentimental hoje
morreram Mercedes

G. Harrison
Brel
não sinto a falta de Lennon aliás nem sabia que sentiria a de G. Harrison
se hoje não tivesse despertado ao som que R. atribuira à sua crónica

frente a frente com a morte às cinco e meia da manhã
uma morte estranha
nada geracional
apenas mortos aqueles para quem olhara achando que
um dia vestiria um casaco de veludo glam rock teria
um namorado de vasta cabeleira para dançar o slow numa festa de garagem
longas pestanas botas brancas mini-saia
um dia de liberdade por certo sentimental
tão sentimental.

3.10.09




(caneta sobre papel, setembro 2009)

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